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sexta-feira, 28 de maio de 2010

Hidrelétricas ameaçam ritual do povo Enawenê Nawê


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Ritual na aldeia Matokodakwa, Terra Indígena Enawenê Nawê. Foto: 
Kristian Bengtson, 2003
Ritual na aldeia Matokodakwa, Terra Indígena Enawenê Nawê. Foto: Kristian Bengtson, 2003

Em fevereiro de 2009, o projeto Vídeo nas Aldeias, em parceria com o Iphan (Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional), do Ministério da Cultura, e a Opan (Operação Amazônia Nativa), iniciou as filmagens do mais longo ritual indígena da Amazônia brasileira, o Yaõkwá, dos índios Enawenê Nawê. O Iphan estava iniciando o processo de patrimonialização, de acordo com o Diário Oficial da União de 25 de maio. Com duração de sete meses, é um dos quatro cerimoniais que os Enawenê realizam todo ano. Com um ciclo cerimonial de 11 meses para reverenciar, alimentar e agradar o panteão de espíritos que podem ser perigosos ou protetores, os Enawenê se alimentam exclusivamente de peixes.
No ritual, os clãs que incorporam os espíritos naquele ano se esparramam pelos igarapés de suas terras, construindo barragens para capturar os peixes nobres que baixam nos igarapés após a piracema. No ano passado, os peixes não retornaram da piracema como de costume. Era a primeira vez que isso acontecia. O período das chuvas havia se estendido além do normal e todos os sinais da natureza que tradicionalmente indicam o tempo da descida dos peixes falharam. O descompasso da agenda cerimonial Enawenê com as mudanças climáticas parecia visível e desastrosa. Desorientados, os índios se perguntavam por que os peixes não tinham subido.


Dois meses depois, os índios pressionaram a Funai para a compra de peixes de criatório. Em três dias a Funai conseguiu dinheiro das construtoras da PCH (Pequena Central Hidrelétrica) Telegráfica para a compra de três mil quilos de peixe tambaqui para darem início ao capítulo mais importante do Yaõkwá.
Pode parecer muito, mas em tempos normais eles pescariam e moqueariam 10 vezes mais, para serem trocados e consumidos nos quatro meses seguintes na aldeia. Em 2009, por conta disso tudo fez com que o ritual tivesse uma versão compactada, e a tradicional troca generalizada de raquetes de peixes no páteo da aldeia não aconteceu. Além de ser a única fonte de proteína, o peixe ainda é a moeda de troca da sociedade Enawenê. Como mandar colocar o estojo peniano no filho adolescente, como fazer as oferendas para os espíritos pouparem o seu filho que está doente, se não houver peixe para pagar?