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domingo, 13 de março de 2011

Palocci terá de administrar dívida do governo passado de R$ 128 bilhões

Cabe ao ministro desatar o nó de R$ 128 bilhões em que se transformaram os restos a pagar, espécie de orçamento paralelo com dívidas antigas do governo.

Com a experiência de quem comandou a economia brasileira no início do governo Lula, o ministro da Casa Civil, Antônio Palocci, se dedica este ano à tarefa de desarmar uma bomba-relógio que já começa a provocar estragos e descontrole nas contas públicas: os restos a pagar, que representam hoje um orçamento paralelo. O valor total inscrito este ano chega a R$ 128,6 bilhões, um recorde espalhado por toda a Esplanada e que atinge quase todos os programas do governo federal. Em algumas áreas, como o Ministério das Cidades, a bomba já explodiu. Lá, o total de dívidas antigas é de R$ 18 bilhões — maior que o limite que o ministro Mário Negromonte recebeu para gastar em 2011, de R$ 12 bilhões.
Palocci já se preocupava com a bola de neve ladeira abaixo quando assumiu o ministério da Fazenda, no início do governo Lula. Tanto é que conseguiu, em 2004, baixar o valor a ser pago em 2005 para R$ 21,6 bilhões. Mas, em 2005, o total a ser quitado em 2006 voltou a subir para R$ 41,4 bilhões e não parou mais (veja quadro). “O orçamento virou a escolha de Sofia: ou se realiza o que vem de restos a pagar ou o Orçamento do ano em curso”, comentava dia desses o senador Jorge Viana (PT-AC), que já foi governador e sabe o que representa um orçamento paralelo elevado.
Do total de restos a pagar, o governo deixou uma parte pelo caminho ao editar um decreto com os limites de gastos por ministério. Dos R$ 97 bilhões que vêm de despesas contratadas em 2010 e dos R$ 30,9 bilhões de anos anteriores, R$ 77 bilhões estão detalhados na legislação. Restam R$ 51 bilhões, dos quais uma boa parte — R$ 38 bilhões —foram cancelados, seguindo recomendação da Casa Civil e do Ministério do Planejamento.
Nesses dois primeiros meses de 2011, o governo já pagou R$ 29,4 bilhões. Tem de tudo um pouco. Os serviços de infraestrutura hídrica — barragens e açudes, por exemplo — têm R$ 770 milhões em restos a pagar pendentes, segundo dados do Sistema de Administração Financeira da União (Siafi). Na área de saneamento, R$ 1 bilhão. Segurança de voo, R$ 568 milhões, dos quais R$ 482 milhões ainda não foram pagos. Há, ainda, R$ 13 bilhões em aposentadorias e pensões.
Emendas
Das despesas de anos anteriores a 2010, a maioria se refere a emendas de deputados e senadores. “Muitos parlamentares têm emendas de 2007 que não foram processadas até hoje e há um decreto que cancela tudo o que não for empenhado até 30 de abril. Como não há perspectiva de processamento, as emendas de 2007, 2008 e 2009 que ainda não foram empenhadas perderão a validade”, reclama o deputado Mauro Benevides (PMDB-CE), referindo-se ao decreto editado em 31 de dezembro do ano passado, que permite ao governo cancelar essas despesas.
A reclamação de Benevides é geral, uma vez que só os valores de restos a pagar do ministério da Saúde e do PAC não correm o risco de cancelamento. Em assistência farmacêutica, por exemplo, há R$ 1 bilhão inscritos em restos a pagar, dos quais R$ 548 milhões constam como pendentes de pagamento.
Margem
O governo, entretanto, não dirá oficialmente aos parlamentares que emendas estão canceladas. A ideia é deixar uma parte contingenciada para administrar a política. Afinal, afirmam os líderes, quem tem expectativa de conseguir recursos para “as bases” — como os deputados chamam os pequenos municípios — sempre vota com o governo. E se essa perspectiva de conseguir emplacar a emenda acabar de vez, a área econômica vai gostar, mas a política não terá margem de manobra. Por isso, avisam alguns, a ordem de Palocci e da ministra do Planejamento, Miriam Belchior, é de cancelar o que der para aliviar a pressão sobre o caixa, mas nem tudo, de forma a deixar uma margem para negociar com os congressistas. Afinal, avisam os técnicos, com orçamento também se faz política.
Ladeira abaixo
Do início de 2002 até o fim do ano passado, a conta dos restos a pagar saiu de R$ 18 bilhões para R$ 128 bilhões, um aumento de mais de 600%.
Ano – Valor
* 2002 – R$ 18 bilhões
* 2003 – R$ 31,6 bilhões
* 2004 – R$ 21,6 bilhões
* 2005 – R$ 36,7 bilhões
* 2006 – R$ 41,4 bilhões
* 2007 – R$ 55,6 bilhões
* 2008 – R$ 78,8 bilhões
* 2009 – R$ 114 bilhões
* 2010 – R$ 128 bilhões
PARA SABER MAIS
“Cadáver insepulto”
Os restos a pagar são vistos pelos técnicos como uma “ficção jurídica” criada pela Lei nº 3.320, de 1964, que trata das finanças públicas. Naquele tempo, considerava-se uma despesa realizada pelo governo quando havia um empenho, ou seja, a separação de recursos para pagar uma obra ou serviço. O valor que era transferido para o ano seguinte era incluído na dívida da União. Era obrigação pagar o que ficasse como “ resto a pagar”. De lá para cá, o conceito de despesa realizada mudou e os restos a pagar não são considerados no resultado fiscal, não entram no cálculo do superavit primário nem influem na hora de verificar se o governo está cumprindo a Lei de Responsabilidade Fiscal.
Os técnicos costumam dizer que esses gastos representam um “cadáver insepulto”, a ser enterrado com recursos que deveriam servir a outra programação. Mas, do ponto de vista político, os restos a pagar permitem ao Executivo escolher o quê e quando pagar, na boca do caixa decidir quem será beneficiado. O risco, entretanto, é alto, porque passa a depender da responsabilidade do governo de plantão. Se for um governo parcimonioso, não gastará mais do que pode, jogando despesas para o ano seguinte. Se gastar demais, a boca do caixa não dará conta de atender tudo o que foi contratado. Foi o que aconteceu em 2010, ano eleitoral. Daí os R$ 128 bilhões que a presidente Dilma Rousseff e Palocci consideram ser hora de dar um basta. (DR)
Denise Rothenburg
Colaborou Josie Jeronimo