Antônio Cruz/ABr


Ao lado do secretário da Receita, corregedor afasta motivação política de 'violações'
A conversão do escritório do fisco em Mauá (SP) num centro de violações trouxe à boca do palco, nesta sexta (27), dois mandachuvas da repartição.
Em entrevista conjunta, falaram sobre o caso Antonio Carlos D'Ávila, corregedor-geral, e Otacílio Cartaxo, secretário da Receita Federal.
A dupla não quebrou o silêncio voluntariamente. D'Ávila e Cartaxo foram como que intimados a mover os lábios pela força do noticiário que os assedia.
De saída, o corregegor cuidou de recobrir o malfeito com o manto diáfano de uma transgressão ordinária, sem conexão com a política.
"Há indícios de uma intervenção feita de alguém de fora da Receita Federal e de um suposto balcão de venda de informação", disse D'Ávila.
Os dados sigilosos teriam sido obtidos “mediante pagamento de propina”. Motivação eleitoral? O corregedor disse não ter detectado um mísero indício nessa direção.
Mas e quanto ao fato de a xeretagem ter alcançado o Imposto de Renda de pessoas ligadas ao PSDB e a José Serra?
Para afastar os objetivos eleitorais nesses casos, o corregedor alega que também empresários e personaolidades alheios à política tiveram os dados apalpados.
Sob concordância do secretário Cartaxo, o corregedor D’Ávila insistiu: "Não identificamos na nossa investigação qualquer ilação político-partidária".
Na próxima segunda (30), o fisco enviará ao Ministério Público um par de representações criminais.
Uma contra a servidoras Antonia Aparecida Rodrigues dos Santos Neves Silva. Outra contra Adeildda Leão Ferreira Leão dos Santos.
Apurou-se que as violações foram feitas com a senha de Antonia Aparecida, na máquina de Adeildda Leão.
D’Ávila descartou a hipótese de a investigação ser concluída antes da eleição presidencial de outubro.
"Nós não estamos preocupados com o calendário eleitoral", disse o corregedor. Participa da investigação a Polícia Federal.
Levando-se em conta que o caso encontra-se em aberto, chama especial atenção o timbre peremptório utilizado pelo corregedor.
Admita-se, para efeito de raciocínio, que tenha sido instalado no fisco de Mauá um “balcão de venda” de dados fiscais “mediante pagamento de propina”.
Parece óbvio que, antes de afastar a motivação política, o governo teria de iluminar a mão que pagou a encomenda. A que partido pertence? Por que comprou?
Uma terceira interrogação bóia na atmosfera conspurcada da Receita:
A bibilhotice dos dados de pessoas alheias à política não teria justamente o propósito de apagar os rastros eleitorais do crime?
De resto, o corregedor parece ter esquecido de um detalhe fundamental: a investigação só foi aberta depois de uma notícia veiculada na Folha.
Na peça, o repórter Leonardo Souza anotara que dados do fisco foram parar num dossiê manuseado por um grupo de “inteligência” do comitê de Dilma Rousseff.
Bem verdade que o PT nega participação no malfeito. Ora, mais a legenda também nega, até hoje, que os aloprados de 2006 tenham agido por ordem partidária.
Outra tese encontradiça na praça é aquela segundo a qual a candiatura de Dilma, por favorita, não teria razões para recorrer a operações subterrâneas.
Bem, é preciso levar em conta que as violações ocorreram numa fase em que a pujança de Dilma ainda não se refletia nas pesquisas.
É possível que os operadores da candidatura oficial nada tenham a ver com os dutos instados na Receita. Mas a hipótese inversa não pode ser negligenciada.
Aos investigadores cabe investigar. A exposição de coisas definitivas antes que as coisas sejam definidas não é algo que soe apropriado na voz de um corregedor.
Repita-se, por oportuno, uma das frases de D’àvila: "Nós não estamos preocupados com o calendário eleitoral".
O contribuinte que paga o salário do corregedor talvez se sentisse mais atendido se ouvisse dele uma declaração diferente.