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sexta-feira, 4 de fevereiro de 2011

Fernando Henrique Cardoso: ‘O Lula foi conservador’

Foi ao ar na noite desta quinta (3), em rede nacional de rádio e TV, o programa partidário do PSDB. Estrelou-o Fernando Henrique Cardoso.
FHC apareceu logo no início da peça (disponível acima). Respondeu a indagações de jovens. Um deles perguntou se Lula o decepcionou mais como político ou como sociólogo.
E FHC: “Eu conheci o Lula no ABC, em São Bernardo, um Lula inovador, que dizia que a CLT tinha de ser liberada...”
“...Que os trabalhadores precisavam ter uma nova forma de relação, sindicato mais independente, nós precisamos de reformas, que precisava mudar o Brasil...”
“...Ele não fez isso. Eu acho que ele foi conservador. Ele aceitou muita coisa que não era boa de aceitar. Alianças. Todo mundo faz alianças. Eu também fiz...”
“...Mas ele ficou até o fim, até promoveu alianças com setores muito atrasados do Brasil. E permitiu que houvesse uma certa complacência com a corrupção...”
“...Esse lado me decepcionou, talvez mais como pessoa do que como presidente”.
A simples aparição de FHC num programa institucional representa notável mudança de procedimento  no PSDB.
Até aqui, embora seja a principal liderança da legenda, o ex-presidente era mantido no armário pelo tucanato.
Foi, por assim dizer, escondido nas três eleições presidenciais em que o PSDB amargou derrotas: 2002, 2006 e 2010.
O problema é que, junto com a ressurreição de FHC, renascem os fantasmas da era tucana. Há um quê de amnésia na fala do ex-presidente.
FHC tem razão quando diz que, nas reformas e na política, Lula foi “conservador”. Conservou o que havia de bom e de ruim no legado que recebeu.
No pedaço benfazejo da herança, Lula manteve intactos os pilares macroecnômicos que começaram a ser erigidos sob Itamar Franco e que FHC sedimentou.
O ex-presidente queixou-se da falta de modernização da legislação trabalhista. Beleza.
Porém, afora o inconveniente político da menção, há o fato de que FHC teve oito anos para realizar o que diz que Lula não fez. Manteve intacta a CLT.
FHC falou das alianças. “Eu também fiz”, reconheceu. Mas deu a entender que Lula fez mais e pior do que ele: “Promoveu alianças com setores muito atrasados do Brasil”.
Esqueceu-se de que, na gestão tucana, um personagem como Jader Barbalho mandou e desmandou na Esplanada.
Esquivou-se de recordar que Renan Calheiros foi seu ministro da Justiça. Repetindo: FHC fez de Renan titular da pasta da Justiça.
Absteve-se de rememorar que José Roberto Arruda, à época filiado ao PSDB, foi líder de seu governo no Senado antes de estrelar o mensalão brasiliense do DEM.
FHC afirmou que Lula “permitiu que houvesse uma certa complacência com a corrupção”. Na contabilidade dos escândalos, porém, há certa equivalência.
Lula arrostou duas crises do Senado. Uma com Renan e outra com José Sarney. Sob FHC também houve um par de crises no Senado. Uma com Jader, outra com ACM.
Lula teve o mensalão. FHC arrostou a acusação de compra de votos na votação da emenda da reeleição. Nas gravações, um deputado acreano citou uma “cota federal”.
Sob Lula, registraram-se malfeitos em órgãos como a Funasa e em estatais como Furnas. Na era tucana não foi diferente.
Submetida a apadrinhados de Jader, a Sudam tornou-se ninho de escândalos que instalaram no Tesouro um dreno estimado em R$ 3 bilhões.
Um grampo clandestino plugado aos telefones do BNDES revelou que a privatização de estatais ocorreu em atmosfera que roçou “o limite da irresponsabilidade”.
Ou seja, em matéria de perversão, os governos de FHC e de Lula são demarcados por diferenças que os igualam.
FHC também falou no programa sobre a necessidade de “dar uma chacoalhada” nos partidos políticos, inclusive no PSDB.
Esmiuçou o raciocínio: "Precisamos estar mais próximos das pessoas, do povo, com menos pompa, coisas mais diretas". Aí, talvez, o maior desafio do tucanato.
Às voltas com uma disputa interna que acomoda 2014 no epicentro de 2011, José Serra e Aécio Neves não falaram no programa.
A dupla apareceu apenas em imagens. Serra surgiu ao lado de Geraldo Alckmin, num instante em que se mencionou que o partido governa São Paulo há 16 anos.
Alckmin falou em seu nome e no dos outros sete governadores eleitos pela legenda no ano passado.
"É essa capacidade de governar que nos tornou o partido que mais elegeu governadores", disse ele nos 17 segundos a que teve direito.
Sérgio Guerra, presidente do PSDB federal, fez uma espécie de balanço da última disputa presidencial. Citou Serra a realçou os votos obtidos por ele no segundo turno.
Falou de Lula em timbre acusatório: "Lutamos contra um adversário que abusou do poder econômico e zombou da Justiça Eleitoral".
De resto, soaram no programa as vozes dos dois novos líderes do PSDB no Congresso.
Álvaro Dias (PR), líder no Senado, disse, a certa altura: “O Brasil está no rol dos países mais corruptos do mundo”.
Duarte Nogueira (SP), o líder da Câmara, declarou: "O PSDB irá fazer na Câmara uma oposição vigorosa ao governo".
O prometido vigor, por ora, não se materializou. O PSDB perde mais tempo procurando um adjetivo do que se opondo.
A publicidade partidária, pelo que expôs e pelo que escondeu, deu idéia do tamanho do desafio envolvido na reestruturação do PSDB.